junho, 03 2024
Com chuvas abaixo das médias históricas desde o fim do ano passado, o Pantanal já teve 880 focos de queimadas em 2024 – um aumento de 898% em comparação ao mesmo período de 2023 (90 focos), ou de 253% em relação à média dos três anos anteriores (2021 a 2023) nesse período (255 focos em média). O número acumulado nos primeiros cinco meses deste ano é o segundo maior dos registros nos últimos 15 anos, ficando somente atrás de 2020, quando foram registrados 2.128 focos. Os dados são do Programa Queimadas do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe).
O avanço das queimadas reforça os alertas feitos por especialistas de que a seca severa no bioma poderá aumentar o número de incêndios de grande escala comparáveis aos que devastaram 30% de suas áreas naturais em 2020. Apenas no mês de maio, foram registrados 246 focos de queimadas no bioma, contra 33 em maio de 2023. A temporada de seca, porém, ainda está em seu início. Historicamente, os incêndios no Pantanal se concentram entre os meses de agosto e outubro, com um pico em setembro.
“Em 2020, tivemos aquele fogo catastrófico e as análises atuais mostram que os números de 2024 estão muito parecidos com os que tínhamos naquele ano. Felizmente, todos os setores e a sociedade pantaneira estão alertas porque têm consciência de que se nada for feito, há possibilidade da repetição de grandes incêndios. É preciso atuar rapidamente reforçando as brigadas e contando com o apoio das comunidades locais para evitar uma catástrofe”, afirma Cyntia Santos, analista de conservação do WWF-Brasil.
Segundo ela, a falta de chuvas, a pouca quantidade de água acumulada no território e o acúmulo de matéria orgânica seca, características dos solos pantaneiros, são alguns dos principais fatores que tendem a exacerbar os incêndios. O Serviço Geológico Brasileiro reportou que o Rio Paraguai, o principal da região, apresenta os menores níveis históricos. Um exemplo é a estação de medição de Porto Murtinho (MS), que manteve uma altura sempre abaixo de 250 cm desde o início do ano, enquanto sua altura normal costuma ser em média entre 250 e 550 cm no período.
“Os rios estão com baixos níveis em diversas partes do bioma e há previsão de que o Rio Paraguai se mantenha esse ano dentro dos níveis mais baixos da história”, declarou Cynthia.
Desde o fim do ano passado, com a seca extrema impulsionada pelo forte El Niño de 2023, os incêndios têm batido recordes no Pantanal. No início de abril, especialistas já alertavam que o bioma poderia passar, em 2024, por uma de suas piores secas da história, já que foi atingido por uma seca extrema em plena temporada de cheias. Segundo dados do Centro de Monitoramento do Tempo e do Clima (Cemtec), do governo de Mato Grosso do Sul, naquele momento as chuvas estavam atingindo níveis de 600 a 800 milímetros, enquanto o normal seria de 1.400 milímetros.
As chuvas, escassas e irregulares nos primeiros meses de 2024, foram insuficientes para transbordar os rios e conectar lagoas e o Rio Paraguai, o principal do bioma, atingido níveis baixos para esta época do ano. Com uma seca tão severa, era previsto que o Pantanal sofreria ao longo de 2024 com a ameaça de incêndios florestais. Com a seca antecipada em 2024, o baixo nível dos rios e as altas temperaturas, há receio de que se repitam os devastadores incêndios de 2020.
Segundo Cyntia, o estado do Mato Grosso do Sul possui uma legislação que estabelece as instruções adequadas para as práticas de Manejo Integrado do Fogo (MIF). “O MIF é uma necessidade primordial para evitar grandes incêndios no Pantanal. Essa lei traz a criação de um fundo que também visa projetos de Pagamento por Serviço Ambiental, que permitem que proprietários façam o manejo das pastagens e a prevenção de incêndios, promovendo melhorias no manejo de pastagens, garantindo a sustentabilidade da convivência harmônica entre seres humanos, criação bovina e manutenção da biodiversidade”, disse ela.
Por conta do alerta de chuvas abaixo da média, o governo do Mato Grosso do Sul decretou situação de emergência ambiental no dia 9 de abril, por 180 dias. No início de maio, com base em dados do Centro Nacional de Monitoramento e Alertas de Desastres Naturais (Cemaden), a Agência Nacional de Águas (ANA) avaliou que os estados de Mato Grosso do Sul e Mato Grosso já estão em situação de seca. Diante da falta de chuvas e temperaturas acima da média histórica na Bacia do Alto Paraguai, a ANA declarou situação de escassez hídrica iminente na região.
Amazônia e Cerrado
Na Amazônia, em 2024 já foram registrados 10.647 focos de queimadas entre 1 de janeiro e 31 de maio – um aumento de 107% em comparação aos cinco primeiros meses de 2023 (5.103 focos) e um número 131% superior à média dos três anos anteriores nesse período (4.580) focos.
Roraima e Mato Grosso concentram as queimadas na Amazônia em 2024. Do total de queimadas registradas entre janeiro e maio, 43% ocorreram em Roraima (4.623 focos) e 36% no Mato Grosso (3.829 focos). O Pará responde por 12% (1.269 focos). No mês de maio, na Amazônia, foram registrados 1.670 focos, sendo quase 78% no Mato Grosso (1.309).
Já no Cerrado, nos cinco primeiros meses do ano, foram registrados 8.012 focos, um aumento de 37% em comparação ao mesmo período em 2023 (5.850) e 35% superior à média dos três anos anteriores (5.956 focos).
“Os biomas brasileiros estão conectados, por exemplo, pela água. E isso significa que são também interdependentes quando se trata das consequências da crise climática. Assim, a conversão e o desmatamento do Cerrado geram desequilíbrios para a Amazônia e o Pantanal, afeta a disponibilidade hídrica em outros ecossistemas, contribui para secas, aumento das queimadas, ondas de calor e até tempestades, como as que afetaram o Rio Grande do Sul”, disse Daniel Silva, especialista em conservação do WWF-Brasil.
“Por isso, não adianta conservar só um bioma, precisamos ter políticas consistentes para diferentes áreas do país. E, no Brasil, barrar o desmatamento é o ponto mais importante para evitar efeitos ainda mais severos da crise climática”, declarou Silva.
O WWF-Brasil tem trabalhado no combate ao fogo nos biomas brasileiros, com foco no apoio a parceiros locais para a formação, o treinamento e fornecimento de equipamentos a brigadas comunitárias. A atuação do WWF-Brasil também envolve apoio para sensibilização, educação ambiental e outras questões relacionadas à prevenção.
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